REFÚGIO DE MARIA
Na Bíblia, Deus é visto como refúgio do ser humano. Essa ideia vem da instituição veterotestamentária das cidades de asilo, existente no antigo Israel, que acolhiam e abrigavam os homicidas involuntários, que tinham cometidos crimes por acidente, que eram protegidos contra o vingador de sangue (redentor), um parente próximo que procurava vingar a vítima e realizar a justiça, matando o assassino. Havia 6 cidades de asilo em Israel. Deus é como essa cidade de asilo que protege aquele que se aproxima dele buscando socorro e perdão. Há 10 salmos que falam de Deus como refúgio e força do ser humano. No contexto bíblico, a misericórdia divina é caracterizada pelo amor que significa ternura, graça, bondade e fidelidade. Jesus estampa em si mesmo a fisionomia dessa bondade, sendo fiel ao Pai e solidário aos homens por suas atitudes juntos aos pobres, abandonados, pecadores e doentes.
Nossa Senhora é como as cidades de refúgio e de asilo, pois recebe sob seu manto protetor todos aqueles que, mesmo depois da maior falta, do mais triste pecado, sinceramente arrependidos, recorrem a ela para merecerem o perdão de seu filho Jesus. Muito foram os santos e doutores da Igreja que se expressaram a respeito deste título mariano:
- Santo Éfrem: “Somente em vós encontra o gênero humano o refúgio, somente por vós espera ser defendido”.
- São Germano: “Ó vós refúgio mais seguro dos pecadores, alívio mais tranquilo dos aflitos, não nos deixeis órfãos, privados do vosso socorro. Se algum dia fôssemos por vós abandonados, onde nos refugiaríamos?”
- São Bernardo Claraval: “Nunca se ouviu dizer que algum daqueles que recorrem à vossa proteção, imploram vossa assistência e reclamam vosso socorro, fosse por vós desamparado”.
- São Basílio: “Como os pobres enfermos, que por causa de suas misérias, vivem abandonados de todos, e só encontram abrigo nos hospitais públicos; assim os pecadores mais miseráveis, embora repelidos por todos, encontram acolhimento na misericórdia de Maria. Deus colocou-a no mundo para ser o refúgio e o hospital público dos pecadores”.
- Santa Catarina de Sena em uma de suas revelações divinas: “Em honra do Verbo, a minha bondade concede a Maria que qualquer um - justo ou pecador - que a venera com a devida honra, que não será vítima do diabo infernal”.
- MARIA COMO RAINHA
Desde o século IV Maria é tratada como rainha para ressaltar sua importância na história da Salvação, ao lado do seu Filho. Diversas orações da antiguidade assim a retratam. De tom solene, Rainha do Céu se origina no século X. No século XVIII, Santo Afonso de Ligório escreveu as “Glórias de Maria”, enfatizando que ela é a Rainha da misericórdia, que “nem o maior pecador se perde, se pedir sua poderosa intercessão na hora da morte”. No sec. XX, o Papa Pio XII instituiu a festividade de Nossa Senhora Rainha, em 1955, alegando que ela é rainha porque é mãe de Deus. Outro argumento do Papa é a participação de Maria na missão salvadora de seu Filho.
O Concílio Vaticano II afirma: “A Virgem Imaculada, que fora preservada de toda mancha do pecado original, terminando o curso de sua vida terrestre, foi elevada em corpo e alma. Para que se parecesse mais com seu filho, Senhor dos Senhores, vencedor do pecado e da morte, foi exaltada como Rainha do Universo”.
- RAINHA DOS ANJOS
Na Bíblia, os anjos são mensageiros, mediadores divinos, são seres espirituais pessoais, imortais, desprovidos de corpo, dotados de maravilhosa inteligência e vontade livre. Recebem missões especiais junto aos homens por ordem divina. O Antigo Testamento afirma que eles guardam a entrada do paraíso, conduzem o povo de Deus, assistem os profetas, protegem o acampamento de Israel, anunciam vocações. A vida de Jesus é cercada de anjos, Maria e José recebem suas visitas, no esclarecimento de suas missões. Encontramos ainda na Bíblia 3 nomes dados aos arcanjos: Miguel, Rafael e Gabriel.
A Igreja ressalta Nossa Senhora como Rainha dos anjos porque ela reina sobre eles porque é mãe de Jesus, Rei das criaturas. Assunta aos céus, ela encontra-se na corte celeste ao lado do filho, cujos anjos estão ao seu derredor. São Bernardo assim declarou: “Maria se equipara aos anjos pela graça, mas os ultrapassa pela efusão do Espírito Santo em seu ser”.
- RAINHA DOS PATRIARCAS
Patriarca na antiguidade designava os chefes da família, dos clãs. Os grandes patriarcas (Abraão, Isaac e Jacó) constituem o fundamento e a origem do povo de Deus. Abraão foi escolhido por Deus para formar o seu povo, tendo sido convidado para deixar sua pátria para habitar na terra prometida. Casado com sara, teve um filho chamado Isaac, e para testar sua fé, Deus pediu o sacrifício de seu único filho. Isaac se casou com Rebeca e teve dois filhos: Esaú (símbolo de fidelidade) e Jacó. Jacó (símbolo da inteligência e habilidade), também chamado Israel, ganhou o direito da primogenitura, ajudado por sua mãe, e recebeu a benção paterna. Antes de morrer abençoou seus 12 filhos, que deu nome as doze tribos do povo de Deus. Nossa Senhora é Rainha dos Patriarcas porque é Mãe de Jesus, pela preeminência, grandiosidade de sua maternidade divina, é a soberana daqueles que deram origem ao povo de Deus.
- RAINHA DOS PROFETAS
Os profetas desempenharam um papel fundamental na vida do povo de Deus, pois são os sentinelas da Aliança dele com seu povo, chamados por ele para exercerem missões especiais de anúncio da palavra e denúncia de injustiças. Maria foi chamada por Santo Éfrem como “a profecia que os profetas profetizaram”. Nossa Senhora é Rainha dos Profetas porque é Mãe de Jesus, o profeta por excelência. Os escritores cristãos percebem que em Maria se realizam as profecias do Antigo Testamento por ser a mãe ( ) do Messias, como nos afirma Isaías (Is 7,14): “Eis que a jovem mulher conceberá e dará um filho, e o chamará pelo nome de Emanuel”.
- RAINHA DOS APÓSTOLOS
Apóstolo significa enviado. A presença mariana junto aos apóstolos e à Igreja primitiva foi marcante, que registram sua presença na comunidade nascente, sendo submissa a autoridade de Pedro e de seus irmãos. É considerada Rainha dos apóstolos porque estará sempre do lado deles, na humildade e no silêncio, infundindo coragem e entusiasmo, sustentando-os nos momentos difíceis que logo começarão. Estará inteiramente presente na missão apostólica da Igreja, cooperando de diversas maneiras. Possui um multiforme raio de ação: mediante a fé e piedade dos fiéis, tradições familiares cristãs, institutos religiosos e das dioceses, e mediante o poder de atração e irradiação dos grandes santuários, como afirmou o então Papa João Paulo II.
- RAINHA DOS MÁRTIRES
Mártir significa testemunha. É o cristão que dá a vida em seu testemunho de amor total por Jesus e sua causa, que o leva a suportar os sofrimentos, as perseguições e as mortes, é aquele que seguiu Jesus até o dom da vida, no seu sangue derramado. Jesus por fidelidade ao Pai, é o mártir por excelência, por entregar sua vida por amor à salvação da humanidade. Maria é Rainha dos mártires porque foi a primeira a suportar o martírio e o sofrimento atroz do filho, que repercutiu nela ferindo-lhe o coração materno, participando com o coração do que Jesus sofria no corpo sobre a cruz. Jesus quis que sua mãe o seguisse até o Calvário para fazê-la partilhar seu sofrimento redentor. Ela é a primeira mártir cristã, fonte de força e inspiração para o martírio.
- RAINHA DAS VIRGENS
Na Igreja, as virgens consagradas constituem o primeiro tipo feminino de especial consagração, existindo desde o início da vida eclesial. O livro dos Atos dos Apóstolos menciona as 4 filhas do diácono Felipe como virgens que tinham o dom da profecia (At 21,8-9). São Paulo já falava da virgindade como vocação e consagração a Deus, sem dividir-se com o mundo (1 Cor 7,34-36). Há diversos estados de vida consagrada com seus diversos carismas: umas vivem em oração, outras em missão, outras dedicadas aos enfermos, órfãos, escolas públicas, obras socais, liturgia e catequese. Sua consagração é sabida somente pelo bispo diocesano e por alguns padres que as orientam. Nossa Senhora é considerada como Rainha das Virgens por ser ela modelo de virgindade e de outras virtudes cristãs para todas elas. Ela as protege e as anima em seu trajeto de vida e vocação.
- RAINHA DE TODOS OS SANTOS
O culto dos santos faz parte da espiritualidade da Igreja segundo a tradição, e suas relíquias autenticas e imagens são tidas como veneração, pois as festas dos santos proclamam as maravilhas de Deus e mostram aos fiéis os exemplos oportunos a serem imitados, como afirma a constituição Sacrosanctum Concilium, nº 111. O fundamento teológico deste culto é a comunhão dos santos, que é artigo de fé da Igreja. Cremos na comunhão de todos os fiéis de Cristo, dos que são peregrinos na terra, dos defuntos que estão terminando sua purificação, dos bem-aventurados do céu, formando todos juntos uma só Igreja, e cremos que nesta comunhão o amor misericordioso de Deus e de seus santos está sempre à escuta das nossas orações (Papa Paulo VI, credo do povo de Deus, nº 30).
Como Rainha dos Santos, Nossa Senhora, que recorda sua vocação à santidade, está acima deles. No sec. V, Basílio de Selêucia destacou a glória superior de Maria em relação aos santos: “Se Deus cumulou de tantas graças seus bons servidores, quais serão os dons concedido à Mãe? Não estarão incomparavelmente acima dos favores concedidos aos súditos?”
- RAINHA CONCEBIDA SEM PECADO
A Igreja afirma que Maria foi concebida e nasceu sem o pecado original, preservada de toda mancha de impureza em previsão dos méritos de Cristo, como privilegio especial divino. Foi declarada Imaculada desde 1854, pelo Papa Pio IX, que assim se declarou na promulgação do dogma: “Recorramos a ela, Mãe dulcíssima da Misericórdia e de graça, em todos os perigos, angústias, necessidades e apreensões. Não pode haver temor ou desespero quando ela é nossa condutora e protetora”. “Maria está tão perto de Deus, que só falta ser Deus, e tão perto dos homens, que só lhe falta o pecado”, afirmava São Bernardo.
- RAINHA ASSUNTA AOS CÉUS
É uma das mais recentes invocações da Ladainha de Nossa Senhora, introduzida pelo Papa Pio XII em 1950, celebrada como solenidade em 15 de agosto. Sua Assunção constitui sua participação na ressurreição e glorificação de Jesus. Um escritor mariano da época medieval assim escreveu: “Sempre houve na vida de Maria uma crescente configuração com Cristo. A graça cristã nos cristifica. Em Maria esse modelar-se, esse deixar-se configurar por Cristo atinge níveis incomparáveis aos de qualquer santo”. “Preservada da corrupção do sepulcro, como suprema coroa dos seus privilégios, foi levada de corpo e alma aos céus, onde refulge como Rainha à direita do seu filho”, afirmou o Papa Pio XII quando da proclamação deste dogma.
- RAINHA DO SANTO ROSÁRIO
Esta invocação foi acrescida à ladainha pelo Papa Leão XIII. O rosário é ao mesmo tempo vocal e mental: enquanto rezamos, falamos com Deus; enquanto meditamos, fala Deus conosco; o nosso rezar são vozes e nosso meditar é silêncio, onde ouvimos a voz divina. O rosário toma a pessoa pela mão e leva-a a refletir nos mistérios de Jesus, ou seja, nos momentos mais importantes de sua vida. É composto dos mistérios luminosos, gozosos, dolorosos e gloriosos. Contemplamos através dele o ministério público de Jesus sob o olhar de sua Mãe.
- RAINHA DA FAMÍLIA
No dia 31 de dezembro de 1995, a congregação do culto divino e disciplina dos sacramentos comunicou aos bispos do mundo inteiro que, por concessão do Papa João Paulo II, foi inserida na ladainha a invocação 'Rainha das Famílias'. A família tem como tarefa fundamental o serviço à vida, colaborando na obra criadora divina para a geração e o sustento dos filhos. É a 1ª escola de virtudes sociais de que precisam todas as sociedades. Nossa Senhora é rainha das famílias porque também a sagrada família de Nazaré, composta por ela, José e Jesus, torna-se exemplo e fundamento destas igrejas domesticas: “Que Nazaré nos ensine o que é família, sua comunhão de amor, sua beleza austera e simples, seu caráter sagrado e inviolável” - Papa Paulo VI.
- RAINHA DA PAZ
A palavra paz aparece na Bíblia 239 vezes. Não significa ausência de guerras ou conflitos. Significa saúde, felicidade, bem-estar, relações sociais equilibradas. Caracteriza-se pela harmonia do ser humano com Deus, consigo mesmo, com os outros e com a natureza. É a tranquilidade da ordem, no dizer de Santo Agostinho. Em plena 1ª Guerra Mundial, o Papa Bento XV introduziu na ladainha essa invocação. A paz é fruto da justiça, dom de Deus e desafio permanente do homem.
Ao refletirmos que Cristo é a paz, mostraremos qual o verdadeiro nome do cristão, se pela paz que está em nós expressamos Cristo por nossa vida. O então Papa Paulo VI assim se pronunciou: “Nada mais oportuno e excelente do que se elevarem a Mãe de Deus as vozes suplicantes de toda a família cristã, quando está é invocada como Rainha da Paz, a fim de que em tantas e tão grandes adversidades e angústias nos comunique com abundancia os dons de sua maternal bondade”.
MARIA NA VIDA E NA TRADIÇÃO DA IGREJA
- MÃE DA IGREJA
A origem dessa invocação é recente, datada de 21 de novembro de 1964, quando do encerramento da 3ª sessão do Concílio Vaticano II, quando o então Papa Paulo VI declarou a mãe de Jesus como Mãe da Igreja. Maria é figura da Igreja, como já ensinava Santo Ambrósio, quer dizer na ordem da graça, da caridade e da perfeita união com Cristo, cabeça da Igreja. No mistério da Igreja, Maria pertence o 1º lugar, por ser de modo eminente e singular exemplo de virgem e mãe. Junto à cruz, já que o Pai abandonara o filho, o filho abandona sua mãe. Confia a Mãe à Igreja. A partir do Calvário, Maria torna-se mãe da Igreja, é a primeira entre seus membros. É mãe da Igreja pela sua vocação de mãe do salvador, e continua nos céus a velar e a cuidar dos membros do povo de Deus em sua grande romaria para a casa do Pai.
É mãe da Igreja por sua intercessão atual e constante. Sua intercessão não diminui em nada a mediação de Cristo, mas decorre dela. A mediação de Cristo é diretamente ativa como autor da vida. Maria é criatura e não autora da vida, e intercede por ela, é chamada por isso a uma colaboração especial com seu criador. Como intercessora depende totalmente de seu filho, que lhe confere essa capacidade. Ela nada tem por si mesma e de si mesma, mas tudo recebeu de Cristo, inclusive a possibilidade de colaborar com ele (J. Comblin, teólogo). Ela protege a Igreja em momentos de dificuldades e perigos como auxilio dos cristãos. O Papa Pio XII consagrou o mundo inteiro ao coração imaculado de Maria no dia 31 de outubro de 1942, em plena 2ª guerra mundial. O então Papa João Paulo II afirmou que Maria ampara assiste e auxilia os que nela confiam por que é a Mãe da Misericórdia, que torna o amor divino perto dela.
- FIGURA DA IGREJA
Ela é saudada como membro eminente e único da Igreja, seu tipo e exemplo perfeitíssimo na fé e na caridade. É modelo e a imagem da Igreja em sua maternidade, virgindade, assunção, e na fidelidade. A missão da Igreja é colocar-se a serviço da salvação, por que essa é a sua missão. A mãe de Jesus foi evangelizada e evangelizadora. Evangelizada porque se tornou a primeira discípula fiel de Jesus, acolhendo e meditando a palavra de Deus em seu coração. Evangelizadora porque ela tornou-se mensageira e portadora de Jesus para a humanidade.
Carregando o Cristo, ela não ficou presa a si mesma, nem estagnada. Colocou-se na atitude de serviço. É a virgem que sabe ouvir, e acolhe a palavra divina com fé, como sugere o então Papa Paulo VI. O testemunho de vida cristã é a primeira e insubstituível forma de missão. Maria deu testemunho da palavra de Deus por uma vida santa, coerente e virtuosa. Ela é um catecismo vivo, um livro aberto onde se encerram as verdades da fé, modelo de missão para a Igreja. É mãe da evangelização porque acompanha a ação evangelizadora da Igreja.
Por Diácono Gildenor da Silva Oliveira
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